Nuances

De repente, tudo começou
Quando pela primeira vez a gente se encontrou
Era uma quinta feira a noite.

Você disse que gostava de Bukowski
E eu lamentava por não ser tão singelo
Por ler Foucault e me achar culto
Por ler Drummond e me achar romântico
Por ler Apanhador no Campo de Centeio e me achar lúcido
No fim da conta nunca estamos lúcidos.

No final da noite nós nos beijamos como se não houvesse amanhã
Como se aquele fosse nosso último dia na terra
Você olha pra mim como um animal olha pra uma presa
E eu te olho com meus olhos de ternura e franqueza
No fim da conta todos estamos francos
Todos estamos no fim dos nossos mundos.

Seu sorriso é de uma natureza morta
Sinto que há um outro lado nessa porta
Nada vejo só os lampejos de felicidade
Você me fez enxergar o valor do amor no caos dessa cidade.
Mas foi por tão pouco.

Não há você agora nos meus braços
Nem na minha cama à noite
Nem nos meus pensamentos
Você não existe mais
E nem está aqui.
Espinhos perfuram minha pele
Meu corpo afunda
Não dá pra chorar
Não dá pra gritar
Não posso parar
Não consigo aguentar.

Hoje não tem Fernando Pessoa
Não tem seu sorriso
E sem ele não tem amanhã
Não tem controle
Não tem Pepsi Cola, nem seus beijos
E nem me refiro àquela canção do Raul
Mas assim como ela, eu não tenho paz nem tenho sossego
Em qualquer canto desse quarto eu viro água
De número em número nesse relógio eu sou o ponteiro
O tempo passa sobre mim certeiro
Revoltas de um passado vingativo.



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