Caldeirão Dos Mitos

Eu vi o céu a meia-noite
Se avermelhando num clarão
Como incêndio anunciado
No apocalipse de São João
Porém não era nada disso
Era um Curisco, era um Lampião

Eu vi um risco nos espaços
Era um revoo de um sanhaçu
Eu vi o dia amanhecendo
No ronco do maracatu
Não era lança de São Jorge
Era o espinho do mandacaru

Vi um profeta conduzindo
Pros arraiais as multidões
Pra construir um chão sagrado
Com espingardas e facões
Não foi Moisés na Palestina
Foi conselheiro andando nos sertões

Eu ouvi um som na escadaria
Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, dó
Não era o eco das trombetas de Josué em Jericó
Era um fole de oito baixo
A tocar numa noite de forró

Vi um magrelo amarelado
Passando a perna no patrão
Não foi ninguém da Inglaterra
Nem de Paris, nem do Japão
Era o Pedro Malazarte, era João Grilo e era Cancão

Eu vi um som ao meio-dia
No mei' do chão do Ceará
Não era o coro dos arcanjos
Nem era a voz de Jeová
Era uma cascavel armando o bote
Balançando o maracá

Vi uma mão fazer o barro
Um homem forte, um homem nu
Um homem branco como eu
Um homem preto como tu
Porém não foi a mão de Deus
Foi Vitalino de Caruaru

Porém não foi a mão de Deus
Foi Vitalino de Caruaru
Porém não foi a mão de Deus
Foi Vitalino de Caruaru

Êta forró gostoso
Segura o folê, arredias
Deixa a poeira subir que desse jeito
Eu vou até amanhã de manhã

Ô meu Deus
Vixe Maria
Ô menino, oxente
Agarradinho desse jeito não



Credits
Writer(s): Braulio Fernandes Tavares Neto
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