Fábula

Num tempo de bruma e sombras
Vestida em pelagem roxa
Era uma vez uma bruxa
Era uma vez uma loba

Seus uivos na noite muda
Tremia os matos e os ranchos
Dos fortes vertia o pranto
Os fracos, Deus os acuda!

Espalhem fardos de sal
Acenem ramos de arruda
Livrai-os, Senhor, do mal!

De dentro da minha alcova
Eu espiava, menino
O vulto breve da loba
Errando pelos caminhos

De um cantinho da janela
Meu coração concluía
Uma figura tão bela
Uma bruxa não seria

Vesti meu poncho mais negro
E entrei na noite uniforme
À vida não vale o medo
Se o coração é enorme

Entre as sombras do arvoredo
Me deparei co'a danada
Mas pros meus olhos ingênuos
Seus olhos eram de fada

Fingindo ares de adulto
Vestindo pele de lobo
Me aproximei do seu vulto
E acariciei o seu corpo

No ventre da noite toda
Agora já não se escuta
Nem o lamento da loba
Nem a risada da bruxa

E a mim, que não tive medo
Depois se revelaria
O resto desse segredo
No rosto de uma guria

Apareceu lá no povo
Morena, linda, esguia
Seu corpo quando caminha
Seus olhos num fim de tarde
Põem a ganir os cachorros
Põem a sofrer os covardes



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